quarta-feira, 29 de junho de 2016

HIATO



Espraio o meu olhar por estes montes, pela profundidade deste céu, tantas e tantas vezes olhado, deixando-me envolver pelo calor do estio transmontano.
Gostava de ser indiferente a isto tudo mas ao meu encontro, em tropel, chegam-me os risos inocentes da minha infância, as férias de Verão com as primas, as "casinhas" e os "bolos de lama"... o despertar da adolescência, os bailaricos, os banhos no rio ... e como num filme, os pequenos dramas de uma juventude rebelde.

Sempre neguei ser transmontana. Não, eu nasci e vivi sempre no Porto.
E é verdade!
Mas esta terra esteve sempre, para o bem e para o mal,  entrelaçada na minha vida.
Qual Scarlett O'Hara, a minha « Tara!»...

Bate-me no peito uma saudade imensa, nem sei de quê, e qualquer coisa, inusitada em mim, rebenta no canto do olho.
A solidão abraça-me de mansinho e o calor aperta.
Lá no alto um milhafre grita-me « Livre!». Observo-o a pairar por cima de mim, na imensidão. « Sempre quiseste a liberdade», acena-me ele.
Tanto Satre, tanto Nietzsche, tanto «Escuta Zé Ninguém»...

Mas consegui-a?
E as amarras dos afetos?
Essas amarras que mantemos e as que se quebraram ao longo de tanto caminho percorrido, de tantos atalhos rejeitados, de outros tantos escolhidos, espinhosos ou floridos?
Que é feito de tantas vidas que, brevemente ou não, se cruzaram com a minha?
Sobem-me aos lábios murmúrios agradecidos por, naquele determinado momento e não noutro, terem feito parte da que fui e assim tornarem possível esta que sou...

" So long, it was so long ago / But I've still got the blues for you".


2 comentários:

Unknown disse...

Simplesmente divinal. Com o teu texto também eu viajei no tempo... Bjinhos

Noémia disse...

Obrigada Teresa. Beijinhos ;)